1 - O espectro da autoimunidade
Anotações do livro Como Tratar Doenças Autoimunes do Dr. Tom O'Bryan
As doenças são resultados de processos de décadas, desenvolvidos numa sequência passo a passo. Em uma ponta do espectro não existem sintomas óbvios, a que nos referimos como autoimunidade benigna. Na outra ponta há um problema de saúde bem definido: doença, ou enfermidade clínica. O espaço intermediário do espectro contém o processo da doença (a acumulação de malefícios, a que nos referimos como autoimunidade patogênica.
A deterioração da saúde pode ser dimensionada em termos da sua intensidade pelo nível dos anticorpos. É por esse motivo que não importa se você nota sintomas ou não. Se tiver anticorpos elevados, eles estão abastecendo a degeneração tecidual.
Sempre que somos expostos a qualquer estopim ambiental (como o glúten, os amendoins, o mofo…), nosso sistema imunológico é ativado para nos proteger. Se o nível de agressão (a quantidade de exposição) aumenta, você poderá experimentar algum tipo de irritação leve como nariz escorrendo, músculos doloridos ou ainda nevoeiro cerebral. Se o nível de exposição continua a aumentar, o sistema imunológico precisará reagir de maneira mais agressiva, o que dá início à inflamação em cascata. O excesso de inflamações causará dano celular, causando dano ao tecido, inflamação no órgão e o aumento da intensidade dos sintomas, e você desenvolverá um nível elevado de anticorpos para aquele órgão, o que leva à lesão desse órgão. Agora você tem sintomas que podem ser identificados como doença autoimune.
Quando você gostaria de saber que estava no espectro da autoimunidade? Você esperaria até ter o órgão suficientemente danificado para que os sintomas fossem perceptíveis ou tentaria descobrir a doença antes que o prejuízo fosse tal que os sintomas exigissem cuidados médicos?
Seus sintomas recorrentes como cansaço, distensão abdominal, falta de energia e lapsos de memória, ou sintomas aparentemente dissociados que aparecem do nada, podem ser mensageiros do seu sistema imunológico avisando que algo está desequilibrado. Os sintomas não são a primeira manifestação de um problema, são a última gota quando seu corpo já não consegue compensar.
Curiosamente, as condições crônicas de saúde são quase aceitas como partes normais da vida: fadiga, dor, depressão, obesidade, insônia, ansiedade, dores de cabeça e muitas mais. Esses sintomas podem ser comuns, mas não são normais. A diferença é enorme: comum significa que muitas pessoas têm; normal significa que “é assim que tem que ser”. Os sintomas “comuns” não deveriam ser aceitos como “normais”.
As piores coisas que você pode fazer é desconsiderar os seus sintomas ou tomar habitualmente analgésicos para lidar com eles. Embora não haja nada de errado em tomar uma aspirina de vez em quando, ou outro anti-inflamatório, quando você os toma regularmente está se expondo a um novo problema. O segundo problema em confiar em analgésicos é que você nunca aborda o problema subjacente que está causando dor. Negligenciar ou suprimir sintomas faz com que o desequilíbrio subjacente continue causando mais danos ao tecido. Precisamos abordar o mecanismo que esteja causando desconforto ou a degeneração continuará a ponto de os medicamentos não mais tratarem os sintomas. Por exemplo, enquanto os antibióticos podem realmente tratar a acne, eles trazem apenas um alívio a curto prazo, o que não atinge a raiz do problema.
Existem quatro diferentes sistemas imunológicos no corpo e cada um deles produz os cinco tipos de reações autoimunes. A maior delas é encontrada no trato gastrointestinal (o intestino), onde se encontra de 70% a 85% da nossa imunidade. Há outro sistema imunológico no fígado, formado pelas chamadas células de Kupffer. O terceiro sistema compreende os glóbulos brancos, encontrados na corrente sanguínea. Por fim, temos um sistema no cérebro, constituído de células gliais.
Se alguma vez você tiver recebido os resultados do seu exame de sangue com as palavras “elevados níveis de anticorpos”, ou o anticorpo vier com uma indicação acima do padrão tido como de normalidade, isto se refere ao fato de que a artilharia pesada está fazendo hora extra para conter uma ameaça detectada, e quer você tenha ou não sintomas, o dano tecidual desses anticorpos está se acumulando.
Os testes de anticorpos (IgA, IgG, IgM) poderiam provar que embora seu filho não tenha uma alergia IgE a laticínios, poderia haver uma reação de uma força militar diferente. Pode não ser a força aérea (IgE), mas poderia ser o exército (IgG) ou a marinha (IgA). Um teste cutâneo não é suficientemente abrangente para determinar uma sensibilidade alimentar. É um teste muito bom, mas destaca apenas uma dentre as inúmeras maneiras que seu sistema imunológico poderia reagir a um alimento ofensivo. Se o seu médico não fizer uma abordagem mais ampla, seu filho poderá continuar se expondo aos laticínios, o que continuará fazendo com que ele se sinta doente.
Depois que o organismo ou alimento ofensivo são destruídos pelos anticorpos, leva-se um ou dois meses para desligar a linha de montagem. Assim, altos níveis de anticorpos ficam circulando na corrente sanguínea, trabalhando, atacando, e às vezes causando danos colaterais bem depois de uma exposição (como o glúten). Isso significa que basta uma exposição para ativar um general específico, e você terá essa reação protetora perdurando por muito tempo. É por isso que você não pode comer “só um pouquinho”, em se tratando de glúten ou de outros alimentos a que possa ser sensível. Descobriu-se que pacientes celíacos que comiam glúten uma vez por mês, mesmo que não se sentissem mal, sofriam consequências enormes, aumentando em seis vezes o consequente risco de morte. Parece ser um preço alto a ser pago por um ocasional cupcake.
Quando nosso sistema imunológico continua produzindo níveis elevados de anticorpos, a coisa é bem séria sob uma ampla perspectiva, mesmo que muitos médicos ignorem, caso você não tenha outros sintomas. É uma mensagem do seu sistema imunológico de que você tem um problema. Anticorpos elevados são um sinal de que seu sistema imunológico está recorrendo a sua última opção para responde a uma ameaça detectada, antes do desenvolvimento da doença. Você não sentirá o dano se acumulando, quando tem níveis elevados de anticorpos, até que seu sistema imunológico destrua tanto tecido que os sintomas aparecem.
Acredito que nascemos com o direito de levar uma vida intensa; só não deveríamos esgotar nossos corpo.
A verdade é que a inflamação não é prejudicial a você. A inflamação excessiva é que é ruim. No entanto, normalmente a inflamação continua, quando a ameaça permanece. Isso pode ocorrer quando continuamos nos expondo, atiçando o fogo com gasolina.
Quando a inflamação sai do controle, você pode sentir sintomas sutis e pensar que talvez esteja “ficando velho”. No início, poderá reparar que ganhou alguns quilos, ou que está mais cansado do que o normal. O tipo de gordura encontrado ali (no pneu extra no abdômen), é chamado de gordura adiposa, e produz 17 tipos diferentes de hormônios, 15 dos quais fomentam ainda mais inflamação. A sequência de inflamações excessivas é o ponto de partida para um processo degenerativo levando ao aumento de peso, ao cansaço, à depressão, à dor crônica, à ansiedade, à insônia e às doenças autoimunes. Praticamente toda doença degenerativa está ligada à inflamação excessiva, incluindo o câncer, a diabetes, o lúpus, a esclerose múltipla, o Alzheimer, etc.
O local onde a inflamação surge pela primeira vez como sintoma é o seu elo frágil da sua cadeia, determinado pela sua genética, pelos seus antecedentes e pela sua exposição ao ambiente. Pode ser que sejam necessárias várias consultas, ou mesmo vários médicos, até que você consiga o diagnóstico certo. Por exemplo, indivíduos com a doença celíaca, tipicamente requerem uma média de cinco médicos e 11 anos de sintomas até receberem o diagnóstico clínico correto de doença celíaca. No momento em que os seus sintomas passam a perturbar o seu cotidiano, o dano tecidual da inflamação já vem se acumulando há anos. Esses sintomas podem acabar encaminhando você a um médico, que talvez se concentre em tratar os sintomas da inflamação, mas é menos provável que aborde a raiz do problema. A inflamação acentuada poderá causar outro problema no seu segundo elo mais fraco - na medicina, isso é chamado de comorbidade.
Se você seguir o conselho do seu médico e tomar seus remédios até que a sua taxa de açúcar no sangue esteja estável, os resultados dos seus exames de laboratório parecerão aceitáveis, mas a própria medicação pode estar colocando-o num alto risco de comorbidade como deterioração mental ou ataques cardíacos fatais, porque o mecanismo subjacente de inflamação que, de fato, provocou o aumento de açúcar no sangue não foi tratado com essa medicação. A inflamação continua causando dano tecidual em seus vasos sanguíneos e no seu cérebro. Também precisamos cuidar da inflamação subjacente que esteja causando a doença. Milhares de médicos descobriram que, incluindo uma abordagem anti-inflamatório no trato da saúde, você pode interromper, e mesmo, em alguns casos, reverter as doenças degenerativas como a diabetes e outras doenças autoimunes.